quinta-feira, 16 de abril de 2009

MUDANDO DE ASSUUNTO-FALANDO DE TECNOLOGIA E SOCIEDADE.

O Admirável Mundo Novo: Fábula Científica ou Pesadelo Virtual?

Maria Clara Corrêa Tenório [*]

RESUMO

O cientificamente possível é eticamente viável? O Admirável Mundo Novo, escrito por Aldous Huxley em 1931 é uma “fábula” futurista relatando uma sociedade completamente organizada, sob um sistema científico de castas. Não haveria vontade livre, abolida pelo condicionamento; a servidão seria aceitável devido a doses regulares de felicidade química e ortodoxias e ideologias seriam ministradas em cursos durante o sono. Olhando o presente, podemos imaginar um futuro semelhante em termos de avanços tecnológicos. Será ele de excessiva falta de ordem, da ordem em excesso preconizada por Huxley ou já vivenciamos o pesadelo virtual de Matrix, a fábula cinematográfica atual ?

Outro dia assisti a um filme de ficção científica no cinema, e, em dado momento um dos atores exclamou estupefato: “É o Admirável mundo novo!”, numa clara referência ao “O Admirável Mundo Novo” de Aldous Huxley. O filme, “O Homem sem Sombra” tratava de um grupo de cientistas subsidiados pelo governo dos Estados Unidos, que realizava experiências genéticas visando conseguir tornar seres vivos invisíveis, através de um processo de decomposição celular. O ator principal acaba realizando a experiência em si mesmo e sua personalidade se transforma, ou melhor, as características negativas de sua personalidade afloram e o dominam. A partir desse momento muitas atrocidades acontecem.
Esse filme confesso, não é daqueles que costumo assistir. Não sou fã de ficção científica, embora alguns autores possam dizer que já estejamos vivendo uma “ficção”. No entanto, fez-me refletir sobre a condição humana e todo o relativo “progresso” que a humanidade tem alcançado neste curto espaço de tempo que vai da Revolução Industrial aos dias atuais. Se por um lado, as conquistas humanas são uma maravilha que nos assombra, por outro, corremos sérios riscos de hipervalorizar tais conquistas e esquecer os limites da dimensão humana. Surgem, questionamentos éticos e mesmo existenciais aos quais não podemos nos furtar de responder: Haveria um limite para o desenvolvimento humano? Se há qual seria ele? Quem vai impor esses limites? O que é cientificamente possível é eticamente viável? Para onde caminha a humanidade? Se a destruição é inevitável o que podemos esperar? Se ela pode ser evitada como isso será possível? Até que ponto o homem é senhor de si mesmo?
Observando a rapidez com que as inovações têm se sucedido é impossível não compararmos esse nosso mundo, que a cada dia traz algo de novo, com o “Admirável Mundo Novo” que Aldous Huxley idealizou, há cerca de 70 anos, em 1931. A obra é uma “fábula” futurista de uma sociedade completamente organizada, sob um sistema científico de castas, onde a vontade livre fora abolida por meio de um condicionamento metódico, a servidão tornou-se aceitável mediante doses regulares de felicidade quimicamente transmitida pelo “Soma” (a droga liberado do futuro), e onde as ortodoxias e ideologias eram “propagandeadas” em cursos noturnos ministrados durante o sono.
Nesse livro, o autor mostra sua visão do futuro e profetiza um mundo bem diferente do que existia em sua época. Para ele, em 1931 vivia-se o pesadelo da excessiva falta de ordem, enquanto a sua fábula no século VII d. F (depois de Ford) seria o pesadelo da ordem em demasia. Segundo ele próprio constata no seu Regresso ao Admirável Mundo Novo, escrito vinte e sete anos depois, em 1957, aquilo que ele imaginava num futuro distante, ou seja, as profecias feitas em 1931 já começavam a se realizar mais depressa do que ele pensava e “O abençoado intervalo entre a excessiva falta de ordem e o pesadelo da ordem em excesso não começou e não dá sinais de começar”. (HUXLEY, 1957: 16).
Como ressaltei, Huxley profetizou em Admirável Mundo Novo, uma civilização de excessiva ordem onde todos os homens eram controlados desde a geração por um sistema que aliava controle genético (predestinação) a condicionamento mental, o que os tornava dominados pelo sistema em prol de uma aparente harmonia na sociedade. Não havia espaço para questionamentos ou dúvidas, nem para os conflitos, pois até os desejos e ansiedades eram controlados quimicamente pelo “Soma”, sempre no sentido de preservar a ordem dominante. A liberdade de escolha estava restrita a poucas matérias da vida. As castas superiores eram decantadas em betas, alfas e alfas + e se originavam de óvulos biologicamente superiores, fertilizados por esperma biologicamente superior, recebendo o melhor tratamento pré-natal possível. Já as castas inferiores, bem mais numerosas, recebiam um tratamento diferenciado: provinham de óvulos inferiores, fertilizados por esperma inferior, passavam por um processo denominado Bokanovsky (noventa e seis gêmeos idênticos retirados de um só ovo) e eram “tratados prénatalmente, com álcool e outros venenos proteínicos”. (Huxley, 1957: 39)

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